[caption id="attachment_303" align="aligncenter" width="225" caption="A única sobrevivente"][/caption]
Está quente. Como nunca esteve. Às duas da tarde desço do ônibus, estou em casa. Da parada avisto uma daquelas ruas típicas dos filmes de faroeste: lojinhas e pequenos prédios apertados sob um sol implacável. Esta é a rua onde moro: um lugar seco e amarelo. Nunca gostei de amarelo e agora então...
A cor da quentura, no entanto, não é um amarelo qualquer. Estes dias, ao descer do ônibus, pensei nisso, fiquei procurando na paleta de cores – ouro, ovo, maple, pele, cheguei, claro, escuro, mostarda. Não é nenhum desses. O amarelo dos dias quentes é doloroso aos olhos, seco e constante, ávido e implacável. Implacável, palavra forte.
Agora, por quê?
A rua que eu via antes, a minha de outros dias, não era amarela apenas: o verde das árvores rompia os tons quentes, gerando sombra e refrescando as cabeças. Minha rua não o possui mais.
E por que cortaram as árvores?
Algumas por que estavam velhas e ameaçavam cair, outras por que os galhos encostavam nos fios elétricos, e outros desses motivos de todo dia. Absolutamente correto que impeçam acidentes, mas por que não plantar novas mudas no lugar das outras?
Acontece que aparentemente desmatar é mesmo um dos grandes símbolos do crescimento urbano, também nesta cidade. Ainda que, paradoxalmente, o prefeito acredite conquistar a simpatia dos maranguapenses reconstruindo praças. Paciência.
Perceba a lógica do tal crescimento urbano: prédio do INSS foi reformado: nova fachada, bancada, central de ar condicionado, novos vidros... providência si ne qua non para inauguração do imóvel: cortar a árvore da frente. Mais: fechar a cova com cimento e azulejo pra garantir que nenhuma árvore tornará a ser plantada no mesmo lugar. A antiga farmácia foi comprada por uma nova rede – reforma, reforma – azulejos, vidros, estantes e, caramba, como fazer uma fachada com essa planta no meio? Essa, no entanto, foi uma das únicas sobreviventes, graças ao verdureiro que vende embaixo da coitada. Mas podaram-na até não mais poder. Hoje, uma outra, mais na frente, também foi cerrada. Acho que nem motivo tinha. Provavelmente hão de providenciar uma saca de cimento pra tapar o buraco.
A SEMAM, órgão que deveria equilibrar o crescimento urbano e a manutenção do meio ambiente, atende aos chamados de desmatamento sem pensar duas vezes. Creio que agem subsidiados pela tosca idéia de que as praças reformadas do prefeito resolvem a nossa cota de árvores necessárias pela cidade. Talvez até seja, quem sou eu pra ter certeza, não é?
Não sou especialista, posso estar enganada, a única coisa que sei é que minha rua está desértica, meu quarto, minha casa, estão áridos e certamente a vizinhança também sente o mesmo. Os toldos de PVC das lojas podem até resolver o problema da sombra, mas estão longe de nos beneficiar com umidade e ar puro. Agora só resta torcer pra que o prédio da antiga Teleceará continue intacto, só lá ainda vejo plantas crescendo pra onde queiram. Sinto falta delas, as tais que ajudavam a tornar nosso lugar menos selva de pedra. Menos amarelo implacável.
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